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ninfeias

O NINFEIAS, núcleo de pesquisa coordenado pela pesquisadora e performer Nina Caetano - professora do departamento de artes cênicas da UFOP - visa a investigação de teorias feministas e práticas performativas. Funciona como uma rede colaborativa, instigando a provocação artística, encontros e trocas entre estudantes da Graduação e da Pós Graduação da UFOP e a comunidade ouropretana.
Atualmente o NINFEIAS é composto por Amanda Marcondes, B. Campos, Caroline Andrade, Caroline de Paula, Caroline Moraes, Danielle dos Anjos, Giulia Oliva, Jackeline Análio, Keila Assis, Marcinha Baobá e Renata Santana.

sexta-feira, 13 de março de 2015

AÇÃO POSTO DE SAÚDE - SANTA CRUZ

relato do movimento, meu ato de silêncio. a denúncia de vários tormentos.
foi terça feira. preciso expor, vomitar essa ação. meu silêncio implora! abra a boca e escreve sobre tudo. - você ainda está em silêncio? sim... e sinto ainda mais tudo. reviver o que passou, as imagens, tudo...

dia dez de março. começo escrever ás 15h09.

fiquei uma hora de frente a ele.
primeiro chego no bairro, me troco, amarro. os barbantes. amarraram me com seus arames. desci. caixinha de música na mão, a minha proteção. desci, comecei minha ação. dançar, dancei. "não há revolução sem dança." dancei, brinquei. e ele sentado no bar.
antes disso, colando frases contra opressão, o mesmo sujeito passou em nossa frente... - eu preciso olhar a pressão.

- você me olhou e eu te olhei. foi isso.

ainda sem falar. queria tanto gritar! mas preferi cantar. que loucura! que força foi essa?! de pagu, de guerreira, de índia. as forças da minha mãe, da minha avó. para mim, foram mais que uma hora de silêncio. foi um tormento.

- não chora, eu não te fiz nada. não chora.

uma hora que meu corpo cresceu, torturas. eu rezei. pedi a d(D)eus que aquele sujeito se afastasse de mim! o espaço do movimento. meu corpo coberto por amarras.

- ela me petrificou. ela me hipnotizou. eu não fiz nada.

quem diria que a caixinha na minha mão, fosse a minha proteção. quem diria... que aquela música que eu odiava, que fica repetindo e repetindo fosse naquele momento a minha única proteção. fosse a minha arma, a minha espada! ele vinha, se encostava. eu o machucava. agradecia a

- dani, sabe me informar se aqui na santa casa tem tratamento alcoologico? - na hora que eu escrevo o meu relato, vem o universo e retoma assuntos.

eu o machucava. agradecia a d(D)eus por minha caixinha não ter formato de coração. minha caixinha pontiaguda. meu trabalho, um lugar de denúncias. o cheiro da cachaça ainda está na minha memória. eu dizia na minha mente: - se afaste de mim! repreendo. eu ordeno que saia. mas, ele saia e vinha. ele brincava. me olhava e repetia o jogo. saia e vinha. eu precisei cuspir.

- É BRIGA!  ouvi alguém gritar.

com a energia ainda viva, meu corpo, minha cabeça. eu precisei de um cigarro. minha força, herança da minha família. eu não fui pega no laço. eu não deixei que ele me oprimisse.

memórias. eu começando a ação.
dançando com as amarras. das mulheres. comecei e vi que ele me olhava. saiu do bar e foi ver mais de perto a menina -eu- dançar.

- o que esse cara está querendo? pensei comigo... ele me olhou e eu, olhei também... mas, ele não parava de me olhar. chegou mais perto de mim. - santodeus, será que ele quer tocar a caixinha? então eu ofereci a caixinha. ele nada, só me olhava e se aproximava.

chegava mais perto, eu sem espaço. eu não conseguia mais dançar. então parei e o encarei. seu corpo se aproximava cada vez mais perto de mim. cara fechada, sobrancelha cerrada. - porque esse cara está aqui?
o sujeito não me dava espaço. começou a usar o dobro do seu tamanho para me encarar. começou a imitar meu olhar. eu não deixei. isso não vai me amedrontar. continuei. cara fechada. agora era só a caixinha que tocava. durante um tempo era só que eu ouvia. parada. exposição da massa. seu corpo. saia e vinha. me oprimia. eu parada. NÃO! ao meu lado eu não te quero. ENCARO O DE FRENTE. esse jogo continuou. até que ele chegou mais perto do meu rosto. voltou - me olhou de cima em baixo E AINDA POR CIMA MORDIA O LÁBIO! olhava meu peito. me olhava sem o menor respeito. olhos ameaçadores. chegava cada vez mais perto. eu o machucava com a minha caixinha.  chegou mais perto, quase encostou seu rosto na minha boca. ameacei, dei um tapa e falei: - você não me encosta.

- tamo junto. ele disse.
tamo junto. você me conhece. tamo junto.

eu não... eu não acredito nas coisas que ouvi. e hoje, depois de três dias que realizei a ação. ainda escuto essa voz. ainda fica repetindo algumas frases da minha cabeça. o cheiro de cachaça. a caixinha parou.

- TOCA! TOCA! TOCA!
ele não parava de falar.
- FALA! FALA! FALA! FALA!
ele não parava de falar.

- Eu Márcio, você? Você me conhece.
- EU MÁRCIO! VOCÊ?

eu não parava de apertar lo com a minha caixinha. ele ainda sorria. ia embora e voltava. parecia que precisava ganhar mais força com o impulso. me olhava.

- FALA! FALA! FALA!

naquele momento... o meu silêncio, foi o meu porto seguro.


espaço movimento. 
naquele mesmo dia, a noite... eu ainda escrevia.





                                                                              hoje.
                                                                              silêncio.
                                                               hoje
 – você não me encosta.

ela é muda.

gestos, e mais gestos. acho que aprendi direito.

sai!
-toca, toca, toca, toca.
- você está tensa.
- ELA ME PARALISOU.

eu estava amarrada. pés, mãos, tronco e uma linha que cruzava tudo. eu não falava. eu no início, só dançava. ela eu, não rela neu.

- você está bem? achei que fosse uma cena.  nem sei onde esse cara mora.
- ele é garçom.
- ele é doente.
- ele é alcoólatra.

- eu preciso de ajuda. – ele dizia. – você precisa de ajuda.

eu?

a be
bida
a bebida não é nenhuma forma de justificativa para qualquer agressão, ação contra a qualquer mulher. não justifica, não insista.
ele insistia.
vinha de cá para lá.
brincava comigo.
- não chora.
- eu não te fiz nada.
- eu não te fiz nada e te perdôo.

CUSPO! CUSPO! CUSPO!

CUSPI NA CARA. SEM MEDO DE LEVAR PORRADA!
CUSPI NO CHÃO. AVISO PRÉVIO MEU IRMÃO.
SEGUNDA VEZ, CUSPI NO OLHO, CUSPI COM ENGODO.
cuspi, cuspi, cuspi. para chamar atenção de alguém. cuspia.
de mãos amarradas fiz o que podia fazer.
cuspir.

- eu não te fiz nada e te perdôo.
- eu márcio, você?
- fala! fala! fala!
- toca! toca! toca!

a caixinha de música, pontiaguda, meu limite minha proteção.
eu machucava, queria que sangrasse.
e ele saia e vinha. saia e vinha
seu olhar me perseguia.
saia e vinha. olhava, oprimia.

- eu preciso de ajuda.
- porque? porque?
- você me conhece.

- ele é garçom.
- ele ta no bar aqui direto, quando eu saio do plantão, ele está lá. já mexeu comigo várias vezes.
- eu achei que fosse uma cena. hoje é a semana da mulher, né?

eu dançava, essa era a minha ação. ele chegou e não parou de desafiar, de encarar, de insinuar, de cutucar, de implorar, de revidar, de chantagear, de exclamar, de atormentar, de se queixar, de vacilar.

- é igual uma luta, né.
- é uma luta né?
- fala! fala! fala! fala!

ele ordenava, cara de quem ordenhava. jeito de sujeito refeito.

- você me conhece.


conheço. está certíssimo. estudo, pesquiso caras desses jeitos. covardes que usam nós, mulheres para se manterem na posição de macho alfa, procriador. conheço e abomino.  

quarta-feira, 11 de março de 2015

OUVIDOS IMPOSSÍVEIS , 
MULHERES IMPOSSÍVEIS



É preciso subverter as sonoridades opressoras do cotidiano para que ecoe a parafernália vocal entalada da minoria mulher.
Quantas músicas você cantou e que não passaram de uma cantada?
Quantas cantadas baratas viraram sangue dentro e fora das casas?
Se queremos novas escrituras sonoras, que comecemos a retalhar nosso corpo em som e impiedade para desmontar o castelo de chumbo onde somos princesas que repetem frases sem sentido e que, sem percebermos, formaram um hino. Um hino do patriarcado.
Quando subverto a canção, subverto meu corpo inteiro e ouço para além das grades, para além da masmorra.
Quando ouço para além das grades, escuto um oásis, seu movimento inacreditável. Onde mora um cuspe de liberdade. E é esse cuspe de liberdade que possibilita o existir das nossas correntezas.
Cada mulher empoderada comporá a sua própria música.
E quando cada uma cantar a sua, junto com a canção da outra, das outras... não há dúvidas de que o ruído insuportável das subjetividades nos soará harmonioso como quem dorme depois de cessada uma guerra.
Abramos escuta para que o timbre da palavra respeito seja mais estridente que o do fiu-fiu nosso de cada dia.
Escutemos os pássaros do quintal para que possamos alçar os vôos certeiros da águia.



"Tornar audíveis as forças não audíveis, como propõe Deleuze. Afirmar um ouvido impossível no lugar de um ouvido absoluto".  (Artefilosofia n.9 p. 71, 2010)





O vídeo acima é um esboço de trabalho, uma possibilidade que tenho vivido e proposto dentro do Núcleo de Investigações Feministas NINFEIAS. E aqui, com as mulheres do bairro Sta Cruz, em Ouro Preto-MG foi elencada a música "Jesus Cristo", de Roberto Carlos, como música de trabalho de um dos grupos de mulheres presentes na tarde de Ocupação Feminista. Depois de escuta, toque e fios de percepções coletiva, nós avançamos para um trabalho de composição musical para uma nova letra para esta canção. Um exercício.
A mulher compositora traceja sua subjetividade propondo uma marca sonora num tempo-espaço. Leio isso como empoderamento feminino. Porque o tempo musical propõe pequenas fissuras no tempo cronológico. 

Pequenas revoluções cantantes, 

micropoderes em gestação e vazão.

vivenciando soRoridades em soNoridades.




(Thaiz Cantasini)


como somos xxy. ou espaço x.



meu lugar em diversas.

foi as sete. comecei num sábado este espaço. procurei um lugar para troca. não, nego o envelope, aceito o batom. – uma legenda. – peço a escrita a papel e canetas.
EM EXPOSIÇÃO.

 parada, estirada de salto alto. a imagem de mulher exposta. o som da valsa número nove,  achismos para nomes que eu esqueço. valsa de Beethoven? danço. o salto permite movimentos curtos, dança ballética. pulinho daqui ali. pausa.
LEILÃO DE ARTE, 1,99. 8 DE MARÇO ÁS 19H.

oito de março era o dia da mulher né? posiciono. batons, marca de abusos, furtos olhares.  curiosos. paro. não há dança. o rock in roll do lugar não permitia que eu... tentei um pouco.  pequena dança. repito passos para lá e pra cá. um aqui outro acolá. caminhos. viva sem descansar. são sete e quarenta e começo.

passaram uns. olharam outros. eu, na pequena valsa. sangrava de olhares.

- porque eu acredito nisso? porque eu ínsito nisso? e de novo sempre os olhares. vou até o fim.

curiosos:

- olha, ta tocando mesmo.  - mas ela tem um nariz, o que será que ela quer que eu faça? - você não fala?

continuo o passo.  aproxima um de verde e seu acompanhante desnecessário.

- olha lá, ela está com o batom borrado.  provavelmente ela foi beijada a força.

o mesmo chegou seu rosto mais próximo. AMEAÇA um beijo. virei o rosto. o acompanhante??

- você não ri? conhece a piada do pintinho que não tinha cú? foi peidar e explodiu.

desnecessário.

saíram um pouco de vista, mas continuaram a admirar a menina de sutiã. passaram algumas horas. eu cansei. sentei. perna aberta para continuar. passa um fardado. escrito atrás segurança.

- aqui não é permitido sentar no chão. por favor, sente se em um banco. por favor senhor, da um banco para ela. são as regras.

olhei nos olhos. respirei no fundo. meu útero. esse homem não vai estabelecer nenhuma ordem.  levantei e sentei em cima do salto. alto. ele deu a volta com o banco. colocou o ao meu lado. – quem esse cara pensa que é? pois então, ficarei descalça. e foi o salto alto que ele viu sentado.  meus sapatos descansaram.

em pé.

olhares tortos.

 olhares soltos.

 os olhares delas.
  
os melhores olhares.

aqueles das nossas, sorrindo de canto de lado. sentiam se representadas? foi o que me deixou em pé. mais forte, vitoriosa.  os olhares.

mas também havia aqueles que só viam a carne, a minha exposição. aqueles olhares que me queriam no chão. passa um. visivelmente abandado pela sociedade. n a margem. ele com muletas, sujo, algumas sacolas, apenas um dente na boca, me olhou:  DELÍCIA.

eu não ... é isso?

continuei a ação. cansada, sem energia. mas havia a troca dos olhares amigas. delas. olhares deram força.  em pé. em cima do banco. cansei mais. me rendi. sentei. mas de perna arreganhada. sub?
passadas, passada. cansada. 
uma criança me olhou. 
do outro lado sua mãe sorria. 
parou.
 no fundo a vontade de imitar lá. 
mas seu olhar desconfiado, 
de lado, 
parou, 
me arrepiou. 

subiu um monte de gente! ao lado. um aplaudia e meio que gritava: - linda.  depois outro apareceu: -  ta tocando.  ai eu tenho medo disso, já fiz ballet.continuei. 

paro quando?  - posso tirar foto? as fotos ficaram lindas.   
que performance linda. 
olha ela, linda.
 borrada, linda. 
sentada, linda. 
calada, linda. 
olha ela... ta protestando, linda. 
é... a sina? 

por favor, peço que exercite outros adjetivos, coloquem sujeitos... imaginem um objeto...e descrevam o predicado.

segunda-feira, 9 de março de 2015

o oito de março.

dia nove.
- hoje dia da mulher?

me pergunto,
passo em frente aos seus olhos carnívoros.
vejo, o presente dos ISMOS.

droga.
abro a porta
e vejo o plim plim,
que plageia canção alheia.
melodia do "hoje eu quero"
sacrifica o "hoje, eu prezo"

- mas dia da mulher é todo dia!

dizem isso,
mas primeiro vem a paródia.
e para evitar a discórdia...
- que isso, é só brincadeira!

- a lá, a mulher não sabe brincar.

colocam na letra,
da primeira pessoa, falando para terceira(O).
hoje é você que vai lavar,
hoje é você que vai trepar,
hoje é você,
porque a cerveja é minha,
hoje não serei sua menina.

teria algo mais cult
do que mandar ir cagar?

e depois de toda a zombaria,
vem logo aquela tia:
- é só brincadeira, bonita.

esse discurso de ódio,
da emissoras
me apavora.

o ato de
dar flores,
coroa
aquelas que.

-ai.

não quero
concluir.